quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Carlos Tell


Carlos Tell
A história que tentaremos descrever é a do filho de Manoel Gomes da Silva e Enedina Silveira da Silva, Carlos Alberto Silva. Nascido em 6 de dezembro de 1943 foi a princípio conhecido como Bebeto era o filho do meio do casal, foi o recheio do biscoito.

Bebeto sempre teve uma aparência altiva. Como o pai tinha uma postura e uma elegância nata, embora com uma certa diferença ou pelo menos, diferença aos meus olhos. A beleza do pai, era envolto de uma simplicidade, simplesmente era. Já o Bebeto tinha consciência dessa beleza e usando uma expressão atual, se ‘sentia’. Com isso passava um ar de arrogância, mas as mulheres gostavam e ele ciente que exercia um fascínio sobre elas, gostava da sensação.

Bebeto fora muito mimado, sua mãe nutria por ele um carinho muito especial, não que não tivesse carinho pelas outras duas filhas, o fato é que com Bebeto era diferente, talvez por ter sido o filho homem ou talvez porque mãe sempre conhece os filhos e via nele há necessidade de uma maior atenção.

Ele sempre soube o que queria e sabia como conseguir, manipulação, persuasão as duas coisas? Quem sabe. As tias Appolônia e Eliza que o diga. Vou exemplificar se ele quisesse ir ao cinema e assistir o mesmo filme 3, 4, 5 vezes ele conseguia, diga de passagem adorava cinema, gostava também de cachorros.

O relacionamento com o pai era tumultuado, o pai rigoroso com a educação dos filhos cobrava muito
dele e ele por sua vez, muito terrível, danado nunca gostou de regras e por não gostar não tornou as coisas fáceis. A mãe Enedina, no meio da guerra entre os dois, viveu como mediadora, sempre tentando acalmar os ânimos.
1ª Comunhão de Carlos Alberto

Quanto a vida profissional, considerando que não gostava muito de estudo, teve sorte. Conseguia com facilidade se empregar em empresas conceituadas, de expressão no mercado. Ocorre que não conseguia firmar nos empregos, embora sempre envolto de grande empolgação pela conquista, talvez por não gostar de regras, do nada chutava o pau da barraca e lá ia o trabalho conquistado com tanto contentamento. Eu particularmente me lembro de quando era representante de remédio e saiu para trabalhar na SHELL, lembro da frase: "trocou o remédio de gente pelo remédio de carro".

A facilidade em fazer amigos e despertar nas pessoas simpatia era nato, mas imbuído em sua autoconfiança, autossuficiência afastou de si muitas das pessoas que o queriam bem, de modo que, amigos, amigos não se tem notícia. Na realidade o Bebeto aprontou tanto nos levando a crer que tinha algum problema de saúde comportamental, não se sabe precisar se de nascença ou adquirida por ocasião da prisão sofrida, há defesa para as duas hipóteses.

Como se deu a prisão. Conta-se que ele fora confundido com um guerrilheiro ou rebelde de mesmo nome no período que o País passava por turbulência política. Ele ficou sumido por três dias o que levou os pais principalmente sua mãe a um estado de tristeza profunda, o pai procurou em vão, só o encontrou por conta da intervenção de um amigo detetive da polícia. Por conta dessa confusão ele trocou o nome Para Carlos Tell. É uma história real? Não se sabe, a prisão foi real, mas o motivo não se sabe, ele sofria algumas crises e quando elas passavam ele não se lembrava de nada. É fato que na véspera da prisão ele tentou entrar de carro, um fusquinha, numa feira intitulada “Feira da Providência”, quando não era permitido entrada de automóvel e ele aprontou das suas na frente do evento. Esse episódio foi apenas um dos seus arroubos.

Bebeto casou-se com Sandra Vasconcelos e desse matrimônio nasceram dois filhos, Maarcellus Tell e Marcus Tell. Com os filhos ainda pequenos o casamento foi desfeito. Os filhos se afastaram do pai ficando do lado da mãe e o relacionamento foi pautado por muito atrito. Não deu certo porque? Por conta do seu gênio, de suas fantasias, da mania de grandeza? Vai saber. Como mencionado ele se sentia. Bebeto teve outros relacionamentos e num desses, com Tania Pessanha Paula, nasceu a filha Carla.

Mas Bebeto ou Carlos Tell apresentava um outro lado, talvez desenvolvido pela maturidade, não sabemos e provavelmente não saberemos, alguns só perceberam ou se deram conta desse lado no fim de sua vida, o que não aconteceu com a Carla que declara na folha 4 de uma cartinha “Mas seu pouco, já foi meu muito. Eu tive pai”. Com relação a sua maturidade, destaco seu último emprego, uma imobiliária em que permaneceu por 15 anos.

Ele, raramente saia com o pai, uma dessas poucas vezes levou o pai a casa das tias Júlia e Appolônia irmãs de seu pai, lugar que o pai gostava, porque era a ligação com as raízes. Carlos Tell creio que também gostava, volta e meia aparecia por lá e saia visitando os familiares. A filha Carla, teve a oportunidade de vir numa dessas vindas. Esse elo com a família ele soube manter.

Conta Appolônia que quando trouxe o pai, esse mostrou o desejo de ficar na casa das irmãs, na casa de seus pais, mas Carlos percebendo que as duas, já de idade não poderiam tomar conta dele, com todo carinho, dizendo que iriam passear, levou-o de volta. Falando em carinho outra pessoa que conseguiu despertar esse lado dele, talvez a única, foi a filha Carla Tell. Essa soube se impor e cobrar dele o papel de pai e ele soube cumprir, ia busca-la na escola e participava dos eventos escolares, assistia as apresentações de dança, isso pode ser comprovado numa carta despedida (postado no grupo no Face “Esse Elo é Família” no dia 21 de abril/2019) escrita por sua filha e uma postagem de Juliana Carvalho na página de Carla Tell no face datada de 07/04/2019 (transcrita abaixo) que ratifica o que aqui foi relatado sobre a personalidade de Carlos Tell.

O pai da minha irmã se foi. Carlos Tell! Pai da Carla Tell. Que nome lindo, ele te deu Carlos foi preso na ditadura, por uma “confusão” Eles queriam prender um Carlos que não era o “Tell”, mas disso ficou esse nome lindo e a história da beleza do amor entre eles. Foram oito meses de prisão (agora não lembro se seis ou oito)
Mas hoje, Carlos, eu quero dizer do amor que sinto por sua filha.
Um amor que você e a mãe dela, permitiram acontecer: Somos mesmo irmãs! Eu fui no primeiro aniversário da vida dela, o aniversário de UM ano. E nunca mais nos separamos! Nunca!
Carla é madrinha do meu filho e meu marido era (é) o melhor amigo dela na quinta série. Hoje Carla namora o primo do meu marido, um grande companheiro para ela. Que bom, né?
Parece que o universo sempre conspirou para esse nosso grande encontro, mas no meio do caminho sempre houve VOCÊ (e Tânia) e OBVIO, meus pais! 💝
Obrigada, Carlos.
Tu me “obrigou” a pedalar e andar de patins no aterro! Tu me obrigou  subir aquele elevado que fica ali da virada para a urca. Eu como sempre reclamona, e vc gargalhando da minhas “dores nas pernas” minhas chatices, enfim... Lembro da Bike roxa que tu deu para a a Carla, eu morri de inveja, viu? Rs
De vc tenho essas lembranças e tbm do Clássico ao me ver: “Jujoca!!!” Lembro da formatura do pré escolar... Estava difícil para vc, mas vc estava lá!V Eu lembro do Fusca azul ! Vc foi buscar a Carla e nos ofereceu uma volta radical naquele carro!! (Sobretudo para meus pais 🙃)
Por muitos anos, fizemos juntos muitas coisas em nome do nosso amor por Carla. Por isso, te agradeço e tô sentindo tua perda.
Devia ter feito mais nos últimos tempos por vcs... Eu lamento. Eu errei. Carlos, vc para mim existe. E agora mesmo estou falando isso tudo para vc, te imagino dormindo em outro plano. Se recuperando e descansando.
Graças a Deus!
Eu tô mirando uma luz violeta desde ontem... Aquela chama que no faz despertar para todos os sentimentos do mundo ao mesmo tempo. Uma verdadeira confusão que só os fortes nos causa. Estou aqui a flor da pele. Mas, Carlos: Enquanto eu viver, vou cuidar dela. Juro, prometo
Vá com Deus, irmão>; Logo nos veremos sem roupa física. Te agradeço por ter sido O PAI de uma das pessoas que mais amo na vida 🙏💝

“A morte, não é nada. Apenas passei para o outo lado do caminho” (parte do poema de Santo Agostinho).

I Encontro da Família Ferreira Gomes
Elizabeth, Elsa, Carlos Tell, Nivaldo e Carla (filha)
Outro ponto que podemos considerar foi o encontro da família que aconteceu em agosto de 2016 no qual esteve presente e se confraternizou com os primos e tios, sua alegria nesse dia era visível, no entanto o que quero relatar aqui não é o encontro, nem a alegria de estar no que podemos intitular, os seus, e sim o fato dele ter se empenhado para que trouxéssemos os seus dois filhos que hoje residem no Espírito Santo, o que infelizmente não aconteceu.

Carlos Tell foi acometido por uma enfermidade que o fragilizou muito, aflorando seu lado família. No entanto se não fosse as irmãs Suely e Sônia e a filha Carla e uma antiga namorada de nome Thereza terminaria seus dias sozinho. Sua filha declara na folha 2 da cartinha já citada “Foi muito pesado ter um pai que cagou quase tudo, menos sua relação comigo”.

Carlos Tell entre as irmãs Sônia Isabel e Suely
O recheio do biscoito.
Em sua luta Bebeto/Carlos Tell perdeu a partida para um câncer. Ele, saindo de cena nos deixou. No dia 05 de abril de 2019 partiu para outro plano, deixando nos que conviveram com ele sua marca, o paradoxo de ousadia e equilíbrio, altos e baixos e três filhos que continuarão escrevendo essa história.

Termino aqui dizendo que creio que ele sempre esteve além do seu tempo. 





quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Antônio Ferreira Gomes Filho



Não gostaria de estar escrevendo essa história, se escrevo é porque a história de Antônio Ferreira Gomes Filho teve um ponto final.

Antônio, nasceu numa família pequena, composta pelo pai (tio Ferreira) a mãe Valdimira e a irmã Ana. Antônio casou-se com Luciene, o casal não teve filhos, um paradoxo para quem amava família, mas a vida tem dessas coisas.

Luciene (esposa), e Antônio
Poucos foram nossos contatos presenciais, creio que dá para contar nos dedos dá mão, no entanto, nossas conversas por telefone pareciam não ter fim.

Dos encontros presenciais, na fase de criança, tenho poucas recordação, talvez pela diferença de idade, na realidade só lembro de uma vez em que ele esteve na casa do vovô com os pais, um tio chamado Manoel Dias e a tia irmã de sua mãe tratada por Xixita e o primo Manoelzinho com a namorada. Dessa família tenho uma vaga lembrança, mas não me esqueci da fisionomia da namorada do Manoelzinho, linda, cabelos escorridos e que me fazem até hoje associar a Ilze Scamparini, jornalista correspondente da rede Globo na Itália.

Embora não me recorde, tenho conhecimento que ele esteve presente no aniversário de 90 anos do vovô, me recordo também que ele gostava muito de fotos e registrava todos os momentos, coisa muito chic, afinal quem naquela época possuía máquina fotográfica? Fotos era seu passatempo predileto. Depois dessa data, levou um bom tempo sem aparecer, até que um dia, relatado por tia Appolônia, apareceu em sua porta, num carrão um homem lindo. Esse homem era ele e Antônio era lindo realmente, embora gordinho para nossos padrões era detentor de uma beleza singular tanto plástica como de interior.

Falando em beleza interior, provavelmente poucos foram os que precisando não contaram com sua solidariedade. Com certeza os que o procuravam não saiam como se aproximaram. Quanto Antônio ficou sabendo que a tia Alice sofria de Alzheimer ele passou a ligar com mais regularidade para obter notícias. Era a forma que tinha de dar atenção. Essa doença neurodegenerativa, por conta da enfermidade da sua mãe, o marcou muito. Ele se compadeci de todos que sofriam da mesma. Contava que havia sido marcado profundamente por ocasião de uma cena presenciada. Ele havia visto sua mãe olhar-se no espelho e perguntar quem era aquela mulher. Isso o chocou tanto que toda vez que se mencionava alguém com o problema ele relatava a cena.

Posso falar também dos meus pais que tiveram dele, por ocasião da enfermidade e morte de minha irmã, toda ajuda possível, tanto dele quanto do pai. Como agradecimento meus pais deram minha irmã para ele batizar. Lembro-me desse dia, dia do batizado da Rosana. Confesso que não me lembro do batizado em si, mas lembro, que aos meus olhos de criança, ele comia muito, lembro que numa refeição ele tomou uma coca-cola família e comeu um abacaxi sozinho.

Bate papo no messsenger
Depois dessas vezes só me lembro de mais três, uma por ocasião da morte do José Machado outra, um ano depois, no enterro de Nico filho do José e a terceira por ocasião dos 90 anos da tia Júlia. Não me lembro de ter estado com ele outras vezes. Contudo, como já mencionei, nossas conversas por telefone foram muitas e essas começaram por conta da casa da praia. Nossas comunicações por meio de outras ferramentas como: e-mail, app Messenger e whatsapp comparando-se ao telefone foram bem raras, ele dizia não gostar muito principalmente de ficar digitando, ainda guardo alguma dessas.

Nossos bate papos eram de horas. Certa vez me contou como eram na sua infância as viagens para cá, dizia ele, “Dia de festa e grande expectativa”. Saiamos do Rio de madrugada, enfrentávamos uma estrada longa e ao chegar a Campos até chegar à Babosa tinhamos que enfrentar estrada de chão esburacada e muitas vezes coberta por lama. A viagem, segundo ele, parecia não ter fim e a tão sonhada chegada parecia adiada. Ele também manteve na memória os causos contados pelo vovô, a cachacinha nas refeições e muitas outras lembranças.

Quantas vezes, de sua parte, recebi elogios pela iniciativa do blog, ele queria mais, sempre sedento de histórias, curioso para saber se havíamos descoberto a origem do vovô. Ele com sua vida contribuiu muito com esse veículo. Já minha história convivência com Antônio, como na maior parte dos relacionamentos houve, pelo menos um, desentendimento, mas nada como uma boa conversa, colocamos os pingos nos “is” e nos entendemos, foi essa a única vez, comungávamos de pensamentos e de sonhos comuns.

No lado profissional, o que sei é que Antônio do ano 70 a 77 teve uma casa lotérica na Travessa Tamoio na Rua Senador Vergueiro com Marques de Abrantes. Coincidência ou não o negócio começou a dar para traz quando resolveram juntar a lotérica, uma bomboniere. Trabalhava com ele Silvio Mambreu e um outro senhor conhecido como ‘painho’, eles foram muito amigos. Painho morava nos altos da lotérica e teve também por ocasião de uma enfermidade a ajuda incondicional do Antônio. Depois só sei da casa de material de construção em Jacarepaguá.

Sandra Mambreu, Rosana e Antônio
No aniversário de 90 anos da tia Julia, o Antônio portador de diabete, mesmo com a saúde abalada se fez presente. Ao receber o convite se emocionou, essa emoção revigorou ao rever as pessoas da família e isso pode ser notada no registro das imagens do dia.

Em 2016 fizemos o nosso primeiro encontro de família, ele, infelizmente com saúde debilitada não esteve presente e eu sei o quanto sentiu.

Nas nossas últimas conversas, pude perceber sua entrega sua falta de perspectiva. Eu dizia para ele: para de bobeira, nossa família vive muito, você vai vencer e viver muito também, dava como exemplo a idade do vovô da tia Julia, mamãe, tio Thomé entre outros. Mas uma coisa o consumia, ele estava triste provavelmente se sentindo sozinho. O que havia ficado dos seus pais, uma única irmã e três sobrinhos com quem não tinham uma boa convivência, não se entendiam, a relação fora marcada por desconfianças. Muitas vezes ele me confidenciou dizendo: Que inveja tenho de vocês prima, uma família tão grande e sem problemas, seu pai morreu, não deixou um terço do que meus pais deixaram e vocês não brigaram, dividiram tudo numa boa e em pouco tempo, enquanto eu e minha irmão, minha única irmã com muito mais bens não nos entendemos. Dos meus sobrinhos só
Ana (irma) e Célio (sobrinho)
com o Célio mantenho algum contato. As outras me desconsideram.

Tenho para mim que isso abreviou sua existência. Por outro lado, não substituindo, mas amenizando, os sobrinhos de sua esposa o amavam e carinhosamente lhe chamando de: “tio gordo”.

Nascido em 11 de abril de 1943, aos 75 anos, exatamente no dia 29 de maio de 2018, Antônio Ferreira Gomes Filho, cumprindo sua missão na terra, nos deixou abrindo pelo menos em mim uma lacuna.


quarta-feira, 9 de outubro de 2019

De Volta



Quando terminei de escrever a história dos filhos de João, fiz um acordo comigo mesma de só voltar a escrever sobre membros desse clã quando esses deixassem de escrever suas próprias histórias, outro ponto que considerei foi quanto ao formato.

Doravante esse blog passa a ter formato de diário, não que vá ser escrito diariamente, mas como aqueles cadernos de adolescência, pelo menos foi assim na minha, local em que relatava emoções, mas apenas como registro, poderei postar algo pesquisado ou descoberto em minhas andanças, num contexto geral será o relato de como as pessoas descritas marcaram minha história.

Infelizmente muito em breve estarei aqui já que tivemos algumas baixas tanto da segunda quanto da terceira geração.