Appolônia - março de 2010 |
Outono de 1930, Antônia Rosa de Jesus, no nono mês de
gravidez, se prepara para dar à luz. O dia era 10 de abril quando nasce a
menina que receberia conforme o preceituado na lei, nome da mãe “Jesus” e nome
do pai “Gomes”, mas Appolônia recebeu o mesmo nome dos irmãos Ferreira Gomes. Quando
foi se cadastrar no Registro Geral (RG) e no Cartório para retirar o Título
Eleitoral, Appolônia se descobre como “Ferreira de Jesus”.
Appolônia cresceu na companhia dos irmãos, mas os
companheiros de brincadeiras e aventuras foram Sérgio, Eliza e Olavo e o tio Neco.
João Ferreira tinha por hábito, nas tardes, depois que os
trabalhadores deixavam a lavoura sair para conferir os trabalhos. João Ferreira
cultivava cana-de-açúcar e como homem de tino utilizava o recurso plantio de consórcio.
Por ocasiões da plantação alternativa João levava Appolônia e Eliza. Ele ia a
frente abrindo covas e as meninas iam colocando as semente, por vezes de milho
por vezes de feijão, em quantidade “x” conforme a plantação exigia. Era dado a cada
menina uma porção de sementes e a orientação era: a tarefa é dada por finalizada assim que as sementes acabem. Assim as meninas eram liberadas podendo voltar para casa ou para as brincadeiras.
Appolônia não parecia dotada de sorte, era sempre a última acabar
com o serviço. Seria esse um sinal que recebia mais sementes?
Outro caso que marcou a falta de sorte da menina se deu em
sua juventude. Antônia, a mãe, criava galinhas. Por ocasião da enfermidade de
uma das filhas teve que ficar na casa da cidade (Campos). O que Antônia fez? Deixou sob
os cuidados de Appolônia e Eliza as criações, em contra partida, os ovos
originados dessas eram das que colhessem podendo assim serem comercializados. As
duas revezavam nos cuidados com as criações num rodízio de 15x15, período que
também ficavam na casa da cidade ajudando a mãe. No entanto, é fato: quantos
dos períodos, na Babosa, cabidos a Appolônia, lá chegando, encontrava
as galinhas no choco. Não tendo o que colher, não tinha o que vender e assim
sendo ficava sem seus míseros “réis” (moeda da época) levando-a por vezes depender de roupas
das irmãs para ir as festinhas do lugarejo.
João Ferreira já não era novo e além da natureza rude possuía
os ranços da idade o que por vezes o fazia violento sendo Appolônia uma das que
mais sofrerá com esse distúrbio de comportamento.
Uma das netas do casal, João Ferreira e Antônia, havia sido
deixada temporariamente na casa destes enquanto a mãe acompanhava no Rio outra
menor que nascera com problemas de saúde. Enquanto, na companhia dos avôs, a
menina sofreu uma fratura no fêmur ficando por meses com gesso, imobilizada, numa
cama. Contava nesta época João Ferreira com aproximadamente 94 anos e sua
lucidez já não era a mesma. João não se sabe o porquê mais uma vez cismou, tendo como alvo Appolônia tenta agredi - lá fisicamente. Appolônia já não era mais uma
menina e nem se fosse não havia nada que justificasse tal ato. A sobrinha vendo
a situação interferiu em favor da tia. O velho João Ferreira que até então não
havia sido contrariado em suas decisões, se revoltou com a petulância da neta e
sem nunca ter sido contrariado, numa ameaça, partiu para agredir a neta. Porém
ele não contava com a agilidade da menina, ela se arrastou até a janela e
colocando a boca no mundo gritou. __ Socorro, socorro ele quer me matar.
Apareceu gente de todo os cantos: Júlia (filha), Nicodemo (morador da casa da
frente – filho), Irene (neta – filha de Nicodemo), Ornila (vizinha) e sabe-se
lá quem mais. Resultado. Appolônia foi passar um período no Rio levada pelos
irmãos. Mas nada passado por Appolônia fez diminuir o respeito pelos pais. Voltou para casa cuidando do pai e da mãe com a ajuda da
irmã Julia até a hora da morte.
Appolônia teve alguns romances, mas abriu mão da vida
matrimonial e hoje aos 82 anos de idade vive na casa da Babosa em companhia da
irmã Júlia.
Ana, Eliza e Appolônia |
Como descrito Appolônia Ferreira de Jesus não teve vida fácil,
sua vida fora marcada por vários fatos dolorosos, sofridos. Mesmo tendo ela vários
motivos para ser uma pessoa revoltada, amarga, não se deixou levar pelos intempéricos da vida. É doce, forte,
equilibrada, religiosa e crédula. Herdou uma coisa meio mística do seu avô
materno José Rosa. Não teve filhos em contra partida ganhou o respeitos de
alguns irmãos, admiração e amor de muitos sobrinhos. Do meu lado tenho por ela
muito respeito, admiração e um imenso carinho.
Gostaria de ter escrito uma história diferente, mas meu propósito
é contar a história da "Família Ferreira Gomes" e esta, é uma das pinceladas deste
quadro. O relato foi fato. Sua história não acaba aqui, está mulher a quem foi
negado por obra do destino, acaso ou sei lá o quê, o direito a maternidade continua
ainda sendo escrita e agora em outras cores.
Quando for gente
grande quero ser como você.
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